Ser chamado para defender a Chapecoense em seu ano de reconstrução e depois de tudo o que aconteceu é uma honra, mas também uma enorme responsabilidade. Representar os heróis que se foram, aqueles que ficaram, um clube, uma cidade e fazer milhões voltarem a sorrir enquanto ainda choram é assumir um grande compromisso. E isso perante os olhares e julgamentos de todo o mundo. Não é preciso explicar o tamanho da pressão.
Imagine então, além de tudo isso, ser também o capitão da 'Chape' em 2017? Wellington Paulista, experiente atacante com passagem por grandes clubes do futebol brasileiro e também com experiências no exterior, foi quem assumiu a braçadeira. E assumiu bem.
Aliás, assumiu sem nem pensar.
Ao receber o convite para defender a Chape nesta temporada, Wellington Paulista, que tinha outras propostas, nem pensou na oferta. Já aceitou se mudar para Chapecó e quer permanecer no 'Verdão'.
O avante foi um dos principais nomes do bom ano da Chapecoense, que manteve o patamar de 2016: campeã estadual, garantida na Série A do Campeonato Brasileiro e com boas campanhas continentais. Com gols importantes, muita luta e liderança, ele ajudou os torcedores da 'Chape' e os amantes do futebol a sorrirem mesmo durante a convivência com a dor neste ano que se passou desde a triste tragédia em 29 de novembro de 2016.
A dor não passa e nunca passará, assim como os heróis jamais serão esquecidos, mas a vida continua e é possível sorrir e seguir caminhando. Em entrevista exclusiva à 'Goal Brasil', o capitão da 'Chape' falou sobre a tragédia e o sentimento de defender a Chapecoense, o ano de reconstrução do clube e muito mais. Confira:
Como tem sido o 2017 na Chapecoense e a responsabilidade de ser o artilheiro e capitão da equipe?
"Começou tudo muito bem. Nós fomos campeões catarinenses, começamos muito bem a Libertadores e o Brasileirão, mas depois tivemos uma queda muito brusca e um período ruim, de briga contra o rebaixamento. No entanto, nós nos recuperamos rapidamente, garantimos a permanência na Série A e sonhamos com mais."
Como foi o momento do convite? O que passou pela sua cabeça quando você foi procurado para defender a Chapecoense?
"Na realidade foi muito complicado, porque todo mundo estava muito emocionado com a situação e eu tinha alguns amigos que tinham falecido e o (Alan) Ruschel, que sobreviveu, com quem eu já tinha trabalhado junto. Foi meio inusitado o convite, porque o meu empresário me falou que tinham algumas propostas para mim: uma com muita responsabilidade e outras mais para aparecer no cenário nacional. Eu perguntei para ele qual era essa da responsabilidade e ele me disse que era a Chape. Aí eu já nem quis mais escutar quais eram as outras."
"Tive o pensamento só de vir para cá e poder ajudar e tentar reconstruir (o clube) de alguma maneira. É lógico que a gente nem tem muito o que fazer, é jogar futebol e tentar fazer os gols para tentar alegrar a torcida de novo. E graças a Deus a gente conseguiu fazer isso bem. Tivemos um começo de ano muito bom e vitorioso. Para a cidade foi muito importante o título catarinense, porque tinha o nome do presidente que morreu (Sandro Pallaoro), então foi muito importante para os torcedores e alguns funcionários do clube que também perderam familiares."
Qual foi o momento mais emocionante para você nesta temporada?
"Acho que foi o primeiro gol, o primeiro jogo, no amistoso contra o Palmeiras aqui (na Arena Condá). Os primeiros momentos foram muito emocionantes porque os familiares que aqui estavam vieram para um jogo festivo e poder ver o novo time."
Passa alguma sensação diferente durante os jogos ou no dia a dia?
"Hoje em dia não. No começo do ano estava até... A gente sabia da responsabilidade que estávamos tendo, na realidade, mas quando você entra dentro de campo você acaba esquecendo tudo, porque é diferente você estar jogando e estar tendo que pensar do lado de fora."
"A gente lembrava só quando chegava o minuto 71 (quando a torcida da Chape canta o famoso 'Vamo Vamo Chape' e presta homenagens aos 71 falecidos na tragédia em 29 de novembro de 2016). No primeiro jogo o juiz parou a partida e todo mundo bateu palmas, e aí sim você começa a se lembrar da situação, mas caso contrário a gente acaba não lembrando muito e procura nem lembrar da situação durante o jogo para não ficar emocionado e desconcentrar no jogo. Mas no começo do ano, antes e depois dos jogos, a gente lembrava e pensava bastante porque é uma coisa que não tem como esquecer."
Durante esta semana que passei em Chapecó, senti que a Chape tem uma atmosfera diferente dos outros clubes. Você é um cara rodado, que passou por vários clubes do Brasil e também jogou na Europa. Você concorda? A Chape é muito diferente de todas as outras equipes?
"Sim, e isso por causa da amizade. O que mais difere a Chape dos outros times é a amizade que existe aqui dentro. No começo do ano vieram 30 jogadores de todos os lados do Brasil e até do exterior, mas a gente conseguiu unir todo mundo em um só objetivo que era vencer, buscar coisas grandes e boas pra Chape. E isso porque o próprio clube já faz isso. O clube já tem essa característica e esse clima de união, e eu acho que isso foi importante para a gente poder se unir ainda mais e se tornar essa família. Isso difere a Chape dos outros times."
E em relação aos torcedores? Você também sente essa diferença no relacionamento?
"Com certeza. A cobrança é igual e existe em todos os lugares. Isso é natural do futebol, até porque se não existir cobrança, o jogador relaxa muito. Mas a torcida aqui é muito diferente porque os torcedores vivem a Chapecoense. É o único time da cidade e todo mundo torce só para a Chapecoense, então isso é importante. O estádio também está sempre cheio, a torcida sempre vem, comparece e nos incentiva do início ao fim, e isso nos motiva dentro de campo também."
Você continua na Chapecoense no ano que vem? Já chegou alguma proposta de outro clube?
"Chegar sempre chega. No fim do ano as ligações aparecem e o empresário começa a ligar, mas eu tenho preferência de continuar aqui na Chape. Já conversei com o Rui (Costa, diretor executivo da Chapecoense), o Maringá (diretor de futebol) e o presidente (Plínio David de Nês Filho) e falei que quero ficar. Eles também demonstraram interesse na minha permanência e vamos resolver tudo certinho."